O agachamento é um exercício físico que, apesar do seu nome dar a impressão de que a importância está apenas na fase de agachar-se, ele visa potencializar também a função de levantar-se. Se pararmos para pensar, o ato de levantar-se é a segunda função que executamos todos os dias após acordar. A única tarefa que vem antes é o ato de passar de deitado para sentado. Basicamente, para realizar qualquer movimento do nosso corpo é preciso de mobilidade articular, flexibilidade e força muscular. Logo, hipomobilidade, encurtamento muscular e/ou tendíneo e fraqueza muscular, são condições físicas que poderão comprometer a execução correta do agachamento em certas amplitudes.
Além de dores e lesões, a diminuição da capacidade fisiológica de qualquer um desses componentes, causados por sedentarismo ou características individuais, também irá afetar o desempenho do agachamento, assim como de outros exercícios.
Como cada função física pode atrapalhar a execução correta do agachamento
Os principais músculos envolvidos no agachamento são o quadríceps femoral, adutor magno e glúteo máximo. Também possuem grande envolvimento neste exercício os músculos abdominais, paravertebrais, isquiotibiais, tríceps sural e glúteo médio como sinergistas e estabilizadores.
Além disso, as articulações envolvidas neste processo são os tornozelos, joelhos, quadris, pelve e coluna lombar.
Quando nos agachamos, os nossos pés firmam-se como pontos fixos ao solo e a tíbia se inclina levemente para frente (e os joelhos também vão para frente). Então, se houver algum bloqueio na articulação ou encurtamento do tendão do calcâneo, na hora de se realizar o agachamento haverá uma tendência de levantar os calcanhares ou senão um desequilíbrio para trás, obrigando o praticante a “jogar” o tronco muito à frente para fazer um contrapeso.
Já para a flexão dos joelhos, o que mais impede o movimento é a falta de força nos quadríceps. Se houver insuficiência de força, haverá a tendência de desabar quando se atingir determinado grau do agachamento. Esse é o motivo mais comum de não se conseguir alcançar o ângulo de 90 graus de flexão de joelhos na hora de agachar.
O encurtamento da musculatura do quadríceps
Porém, outro problema menos comum que costuma atrapalhar a execução deste exercício é um excessivo encurtamento da musculatura do quadríceps, o que também impede um grau maior de flexão dos joelhos. Portanto, nesse tipo de situação poderá haver uma tendência de jogar os joelhos para frente para tentar descer um pouco mais ou levar o tronco muito a frente e para baixo para dar a impressão que se está descendo mais.
Além disso, nos quadris, há diversas situações que podem impedir sua movimentação correta. O quadril, por ser uma articulação com enorme grau de liberdade, está sujeito a diversas situações em que sua movimentação pode estar comprometida. Algumas delas, são:
- Bloqueio na articulação glenoumeral (junção de fêmur com a cavidade glenóide do quadril);
- Encurtamento de glúteos;
- Encurtamento de isquiotibiais;
- Falta de força em glúteos;
- Falta de força em glúteo médio
- Encurtamento de adutores;
O bloqueio na articulação pode limitar a flexão dos quadris fazendo com que haja uma tendência de o tronco ir para trás à medida em que se flexiona os joelhos. Desta forma, neste caso, também pode ocorrer de se querer curvar o tronco para frente para fazer uma compensação do peso.
Força de glúteo e encurtamento de adutores
O mesmo pode acontecer no caso de encurtamento de glúteos e isquiotibiais, uma vez que esses músculos se originam na pelve (ossos ilíacos e ísquios) e se inserem no fêmur. Então, na hora de agachar, esses músculos irão segurar o movimento impedindo a aproximação da pelve com a coxa. Também, neste caso, haverá uma tendência de se curvar para frente.
A falta de força de glúteos pode limitar o grau de agachamento pela falta de capacidade de suportar o peso do corpo na hora da execução. Já a falta de força em glúteo médio pode tirar a estabilidade lateral do quadril fazendo com que haja uma tendência em não conseguir se manter o alinhamento dos joelhos. Assim, isso fará com que os joelhos sejam “jogados” para os lados.
O encurtamento de adutores é uma condição que pode impedir a descida quando os pés estão mais afastados um do outro, isso porque haverá a sensação de estiramento dessa musculatura e, portanto, o impedimento de descer mais e realizar a execução correta do agachamento. Logo, isso fica ainda mais evidente no agachamento sumô, modalidade onde os pés ficam mais afastados e rodados para fora, o que exige muito mais de força e flexibilidade dos adutores.
Portanto, a falta de força de adutores fará com que haja uma tendência de os joelhos irem para os lados, tirando o seu alinhamento.
A região lombar e o agachamento
Indo para a região lombosacra, a falta de força na musculatura paravertebral e abdominal fará com que o tronco inteiro fique sem estabilidade. Logo, isso pode influenciar o tronco a se curvar para a frente.
Já a falta de mobilidade lombar poderá fazer com que não se consiga manter a coluna estendida. Assim, isso fará que haja uma tendência de o corpo ir para trás, tirando todo o equilíbrio do movimento.
Postura ortostática em flexão
Existem alguns outros fatores que podem estar atrapalhando a execução correta do agachamento mesmo antes de se começar o movimento.
O encurtamento importante de flexores de quadril (músculos psoas maiores e retofemoral) é uma dessas situações. Esta condição faz com que essa articulação fique levemente flexionada o tempo inteiro. Logo, há a tendência de, durante a realização do exercício, a pessoa permanecer o tempo inteiro levemente inclinada para a frente quando de pé.
Também, o encurtamento importante de flexores de joelhos (isquiotibiais) faz com que os joelhos permaneçam levemente flexionados o tempo inteiro. Dessa maneira, esses fatores fazem com que a pessoa encurtada permaneça o tempo inteiro semiflexionada quando está em pé. Este tipo de limitação é importante de ser observada, uma vez que, caso não sejam avaliadas com a devida atenção, podem passar despercebidas.
Tenho dificuldade em realizar agachamentos. Como saber quais limitações eu possuo?
Para saber se você ou seu aluno possui algum bloqueio articular ou uma falta de flexibilidade, primeiro procure isolar cada segmento envolvido no exercício. Os músculos gastrocnêmio, retofemoral e isquiotibiais (com exceção da cabeça curta do bíceps femoral) são biarticulares, ou seja, tem sua origem em dois segmentos e realizam um movimento principal e outro secundário.
O gastrocnêmio insere-se tanto na tíbia quanto no fêmur, realizando tanto o movimento de flexão de joelho quanto flexão plantar. Portanto, para poder testar a articulação do tornozelo, iremos limitar a ação de flexão do joelho.
Para isso basta deitar-se em decúbito ventral e flexionar o joelho em 90 graus. Logo, isso tira a ação da porção femoral do gastrocnêmio, deixando-o mais relaxado. Então, você deve realizar a dorsiflexão e verificar seu grau de amplitude. Se houver um bom grau de flexibilidade, de pelo menos de 15 graus, então a maior probabilidade é que o problema seja o encurtamento muscular e/ou tendíneo.
Para investigar se seu reto femoral funciona de maneira correta, devemos fazer outro exercício. O reto femoral insere-se tanto no fêmur quanto na espinha ilíaca realizando tanto a flexão do joelho quanto do quadril. Então iremos isolar a ação de flexão do quadril deixando-o em 90 graus. Se, dessa maneira, não for possível flexionar o joelho em até 90 graus, então a maior probabilidade é de que haja encurtamento muscular do retofemoral.
Testando a articulação de quadril
Para testar a articulação do quadril, iremos flexionar os joelhos para limitar a ação dos isquiotibiais. Saiba que os isquiotibiais têm sua origem tanto nos ísquios quanto no fêmur e são responsáveis pela flexão do joelho e pela extensão do quadril. Portanto, se o seu quadril flexionar em até pelo menos 90 graus, então a maior probabilidade é de que haja um encurtamento de glúteos, não nos esquisiotibiais,
Limitações na região lombar
Analisando a região lombossacra é preciso verificar se há extensibilidade na região. Então, em decúbito ventral, iremos fazer o movimento de empurrar o chão estendendo os cotovelos (movimento conhecido como “Swan” no pilates ou “cachorro olhando para cima” na yoga). Se ao realizar o movimento não for possível manter a região das coxas no solo, então a maior probabilidade é de haver hipomobilidade na região lombar.
Portanto, se você verificou que não há nenhum tipo de limitação no seu exercício, nem por encurtamento nem por bloqueio articular, então o que está limitando a amplitude do movimento provavelmente é a falta de força muscular no quadríceps e/ou nos glúteos. Além disso, outro fator que dificulta a correta execução correta do agachamento é a questão do aprendizado motor e coordenação dos movimentos.
Assim, como pode-se perceber, inúmeros fatores podem estar atrapalhando a execução ou evolução do exercício de agachamento. Os bloqueios articulares são mais raros e geralmente são problemas congênitos ou decorrentes de lesão. Porém, a falta de força e/ou de flexibilidade são decorrentes da falta de atividade física e de alongamento, portanto, são problemas mais fáceis de resolver.
Exercícios corretivos para suas limitações
A partir do momento em que as dificuldades foram identificadas, podemos tentar driblá-las. Para isso, iremos trabalhar em cima das suas limitações, utilizando acessórios facilitadores e exercícios auxiliares de fortalecimento e alongamentos.
Para as dificuldades relacionadas à flexibilidade e mobilidade, deve-se trabalhar individualmente cada uma das situações. Agora, para as dificuldades relacionadas à falta de força e coordenação motora, executar o exercício corretamente com algum acessório facilitador ainda é a melhor maneira para o corpo trabalhar de forma funcional e síncrona.
Portanto, a fita de suspensão (TRX) é uma ótima alternativa. Para isso, você deve segurar o elástico bem forte preso à frente em uma barra fixa, ou mesmo diretamente na própria barra (espaldar por exemplo). Também, essas são ótimas maneiras de utilizar a força dos braços para ajudar a controlar o peso do corpo.
Para quem não tem falta de força em membros inferiores, mas tem dificuldade em manter o alinhamento postural, segurar pesos à frente do corpo, como um par de halteres ou um kettlebell, ajuda a contrabalancear o peso e manter a coluna lombar mais ereta e estável.
Conclusão
Portanto, saiba que somente quando a execução estiver da maneira ideal, sem compensações e sem auxílios de acessórios, pode-se começar a pensar em um trabalho de potencialização do exercício. A execução correta do agachamento é muito importante para a eficiência do exercício.
Trabalhar aumento de carga ou mesmo exercícios pliométricos (explosão muscular) sem que haja a correção de todas as dificuldades encontradas, pode desencadear lesões e mais atrapalhar do que beneficiar a sua saúde física. Segurança e integridade física sempre vêm antes da performance. Além disso, lembre-se: procure sempre a ajuda de um profissional qualificado.
Referências:
http://www.periodicos.ulbra.br/index.php/actabrasileira/article/view/2948
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-35552011000300006&script=sci_arttext&tlng=pt
https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1517-86922010000300015&script=sci_arttext
McARDLE, W. Katch, W. Katch. Fisiologia do Exercício. Energia, Nutrição e Desempenho Humano. 7ª Edição. Rio de Janeiro, Guanabara Koogan, 2011.
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artigo excelente!
poderia apenas traduzir alguns nomes tecnicos para o portugues informal e assim, tornar o entendimento um pouco mais palatavel para o leigo.
No mais, otimo material de estudo e aperfeicoamento da execução dos exercicios.
parabens e obrigada